Muitos e muitas profissionais da área nem sabem da existência desta data criada em 2014. Na realidade sempre comemoramos o dia do engenheiro em 11.12, sem evidenciar gênero.
O CREA, que recebi em 1986, no título o nome escrito é Engenheiro Civil, confesso que isto nunca me incomodou.
Comecei minha carreira na construção civil em 1977, quando ingressei no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo, no curso de Técnico em Edificações.
Minha sala em 1977 era composta de cerca de trinta meninas. Em 1980, na formatura, nos formamos em quatro destas meninas, pois no Liceu, quem repetia tinha de sair do colégio. Enfim, na época tudo era novidade, sonhos, e adorávamos tudo que se referia a nosso curso. Das quatro eu e uma amiga continuamos na engenharia, uma se tornou dentista e a outra não tenho notícias. Entrei na faculdade em 1981, e no primeiro contato com minha turma, pensei:- nossa só tem homens!
Não sei dizer quantas mulheres haviam no primeiro ano, chuto que éramos umas quatro, sendo que uma vinda da Matemática da USP, outra da Fatec e uma que veio do colégio normal. E éramos em uns cem alunos mais ou menos. Minha turma, de todos os anos que vieram, foi a turma dos meninos, aqueles que estudavam sério, e se formaram em seis anos que era o tempo do nosso curso, na época a única faculdade de engenharia civil e elétrica que havia a noite.
Não foi fácil concluir o curso, faltava dinheiro para pagar a faculdade mais cara da cidade de São Paulo, pois não quis esperar mais um ano, para fazer a Fuvest novamente, onde faltaram cinco pontos para ingressar na Poli USP, meu sonho!
Tive que trabalhar duro durante o dia, fazia muitos “bicos” para sustentar meus estudos, consegui bolsa de estudos nos primeiro ano apenas, bolsa esta que paguei após formada.
Trabalhava e estudava.
Não foi nada fácil, mas sempre fui ótima aluna, com ótimas notas.
No meio de tudo isto, faltava tempo pra pensar que era também mulher.
Após a formatura estávamos em plena crise na construção civil, empregos eram escassos, para as mulheres muito pior. Desta forma aceitava o que aparecia. Tinha me demitido do meu emprego público no Estado de SP, o salario era muito baixo e como Auxiliar de Engenheiro não tinha chances de mudar de cargo para Engenheiro, preferi sair e me aventurar.
Não me lembro de ter sido preterida por ser mulher quando fazia meus bicos, mas sentia quando buscava emprego na iniciativa privada. Sempre escolhiam homens. Por várias vezes este fato me incomodou e revoltou. Mas a vantagem da mulher é sua força e garra e continuei na luta, luta alias que travo até os dias atuais.
Em momento algum me vitimei em qualquer situação descrita, e quando conseguia trabalho através de anúncios em jornais, indicação de amigos, ficava muito feliz.
Ser mulher na engenharia, é tirar o salto alto dos pés, o batom dos lábios e entrar dentro da lama como qualquer outro engenheiro. É comer marmita junto com o pessoal da obra, é saber falar e se impor dentro da obra com educação e com firmeza sem usar de grosseria e arrogância.
Ser mulher é fazer de conta que não ouviu a piadinha, mas evidenciar quem a fez a te dar retorno no trabalho dele, se sabe fazer piada, tem que provar que sabe trabalhar.
Ser mulher em obra é suportar calor e frio, poeira e vento, sem se incomodar com a sujeira.
A engenheira conquistou mais espaço dentro das empresas, muitas em cargos de direção e gerência. E conquistou na luta!
Creio estarmos chegando em um nivelamento entre homens e mulheres.
E espero que em breve, as mulheres tenham só que buscar trabalho e não necessite mais lutar contra os homens. Pois o lugar das mulheres é onde ela desejar estar.
Eng. Civil Odete dos Santos
Vice Presidente do Conselho Deliberativo da EngD – Engenharia Pela Democracia.
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