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Editorial da EngD | O trabalho no centro da pauta internacional



É provável que a Parceria pelos Direitos dos Trabalhadores e Trabalhadoras, assinada pelos presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e dos Estados Unidos, Joe Biden, na quarta-feira (20), em Nova York (EUA), não tenha precedente no âmbito das relações internacionais. Num mundo envolto por disputas comerciais e conflitos regionais, parece não haver tanto espaço para que o trabalho seja o centro de uma pauta multilateral.


Por isso, o acordo firmado entre os dois países, com o apoio da OIT (Organização Internacional do Trabalho), faz história. A declaração conjunta reforça a preocupação com os direitos da classe trabalhadora, bem como com o “trabalho digno”. De modo ousado, o documento atesta que “os trabalhadores e as trabalhadoras construíram os nossos países – desde as nossas infraestruturas mais básicas e serviços críticos, à educação dos nossos jovens, ao cuidado dos nossos idosos, até nossas tecnologias mais avançadas”.


Outro ponto fundamental foi a defesa do sindicalismo. Diz o texto: “Pretendemos trabalhar em colaboração entre os nossos governos e com os nossos parceiros sindicais para fazer avançar estas questões urgentes”.


Em respostas à grande crise capitalista de 2007/2008, as legislações do trabalho regrediram em todas as regiões do Planeta. Conforme a OIT, 110 países promoveram reformas trabalhistas de viés liberal entre 2008 a 2014. O efeito dessas reformas foi a precarização das condições de trabalho, além do desemprego. No Brasil, o golpe contra os trabalhadores começou em 2017, com a reforma trabalhista e a lei da terceirização irrestrita, sancionadas pelo governo Michel Temer. Tudo se agravou com a gestão Jair Bolsonaro e com a pandemia de Covid-19.


Lula e Biden deixaram claro que a “fórmula” proposta pelo capital fracassou. “Os trabalhadores e trabalhadoras e os seus sindicatos lutaram pela proteção no local de trabalho, pela justiça na economia e pela democracia nas nossas sociedades”, aponta a declaração. “Hoje, os Estados Unidos e o Brasil anunciam o lançamento da nossa iniciativa global conjunta para elevar o papel central e crítico que os trabalhadores e trabalhadoras desempenham num mundo sustentável, democrático, equitativo e pacífico.”


Afora o respaldo ao movimento sindical, Brasil e Estados Unidos avançam em cinco desafios:


1) Proteger os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, tal como descritos nas convenções fundamentais da OIT, capacitando os trabalhadores e trabalhadoras, acabando com exploração no trabalho, incluindo o trabalho forçado e trabalho infantil;
2) Promover o trabalho seguro, saudável e decente, e responsabilização no investimento público e privado;
3) Promover abordagens centradas nos trabalhadores e trabalhadoras para as transições digitais e de energia limpa;
4) Aproveitar a tecnologia para o benefício de todos;
5) Combater a discriminação no local de trabalho, especialmente para mulheres, pessoas LGBTQI e grupos raciais e étnicos marginalizados.

A coalização global, iniciada por Brasil e Estados Unidos, terá adesões significativas. Que seja uma pauta presente em outros organismos multilaterais, que entendam a valorização do trabalho como parte essencial de qualquer projeto orientado ao crescimento econômico e ao desenvolvimento. Brasil e Estados Unidos deixaram claro: “Esperamos que outros parceiros e aliados se somem a este esforço. Juntos, podemos criar uma economia sustentável baseada na prosperidade compartilhada e no respeito pela dignidade e pelos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras”.


Biden gosta de dizer que não foi Wall Street que construiu os Estados Unidos. Na cerimônia com Lula, reforçou que os trabalhadores não podem ficar desprotegidos. “Não queremos que só uma classe se saia bem. Queremos que os pobres tenham oportunidades de subir na vida, e essa visão é impulsionada por uma força trabalhista forte”, afirmou. “É por isso que o meu governo tem sido chamado de o governo mais pró-sindicatos da história dos Estados Unidos.”


A parceria com o Brasil faz sentido. Lula é um caso raro de metalúrgico que chegou ao poder. Mesmo no antigo bloco socialista hegemonizado pela União Soviética, houve pouquíssimas experiências de presidentes de origem operária e sindical. Em governos anteriores, Lula legalizou as centrais sindicais, implantou a política de valorização do salário mínimo e fortaleceu as negociações coletivas. Agora, tem a missão de reverter a derrocada de direitos decorrente do golpe de 2017.


Em seu terceiro mandato, Lula retoma políticas e avança em pautas como a regulamentação do trabalho mediado por aplicativo – os “uberizados”. Em Nova York, o presidente brasileiro reforçou sua luta: “É inimaginável que nesse mundo todo digitalizado, todo moderno, o ser humano seja tratado como escória, como se não merecesse respeito”.


Sejam operários ou agricultores, sejam comerciários, prestadores de serviços ou funcionários públicos, os trabalhadores precisam desse respaldo – que não é nada comum entre governos federais. Os sindicalizados são menos de 10% tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, o que enfraquece a luta do trabalho ante o capital. Não por acaso, Lula ressaltou “não há democracia sem sindicato forte. Porque o sindicato é efetivamente quem fala pelo trabalhador para tentar defender os seus direitos”.


Estamos diante de uma espécie de obra aberta num processo político convulsionado. Essa obra se inicia singularmente por uma centralidade no mundo do trabalho e poderá evoluir para novos temas relevantes – o que vai ajudar a minimizar as contradições naturais entre as políticas externas e internas. O movimento Engenharia pela Democracia (EngD) tem a consciência de que é fundamental trazer para a pauta dessa iniciativa as reinvindicações e desafios das decisivas camadas médias universitárias do Brasil, dos Estados Unidos e dos outros países.


Nesse sentido, a EngD se irmana com a plataforma da CNTU (Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários), que reúne 60 entidades sindicais e federações de engenheiros, economistas, farmacêuticos, odontólogos e outras categorias. São mais de 2 milhões de profissionais nesta caminhada por uma sociedade do conhecimento e do saber.


A luta por valorização do emprego e de oportunidades de trabalho, pela Ciência, Tecnologia, Engenharia e Inovação, pela educação continuada, pelo trabalho decente e contra a precarização, pelas artes e cultura deve constar da coluna vertebral dessa Coalizão Global pelo Trabalho.


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