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Sabesp privatizada, povo hospitalizado e governador agraciado em Nova Iorque

Foto do escritor: EngD EngD

José Manoel Ferreira Gonçalves



Primeiros Impactos da Privatização


A privatização da Sabesp, concluída em julho de 2024 sob a gestão do Grupo Equatorial, trouxe promessas de investimentos e expansão dos serviços de saneamento. O governo paulista e a nova administração anunciaram um plano de R$ 260 bilhões até 2060, com R$ 69 bilhões até 2029, visando antecipar a universalização do saneamento para 2029. Além disso, teria sido aplicada uma redução inicial de tarifas, principalmente para consumidores de baixa renda.

Contudo, os primeiros meses sob gestão privada já levantam lamentáveis questionamentos sobre a efetividade da operação e os impactos negativos para a população.


Aumento das Tarifas e Cobranças Abusivas


Embora tenha sido prometida uma redução tarifária, relatos de moradores indicam cobranças excessivas. Um caso emblemático ocorreu na Favela do Nove, na Vila Leopoldina, onde moradores receberam contas superiores a R$ 10 mil, evidenciando falhas no novo modelo de precificação. Esse tipo de ocorrência levanta preocupações sobre reajustes futuros e a transparência na cobrança pelos serviços.


Historicamente, privatizações no setor de saneamento resultaram em aumentos progressivos nas tarifas, como ocorreu em outros estados do Brasil e no exterior. A lógica de lucro das empresas privadas invariavelmente se sobrepõe ao caráter social do serviço, tornando o acesso à água mais oneroso para os mais vulneráveis.


Venda das Ações Abaixo do Valor de Mercado


Outro ponto controverso foi o valor de venda das ações da Sabesp. Especialistas apontam que o governo paulista aceitou uma oferta inferior ao potencial de mercado da companhia, resultando em uma perda estimada de R$ 4,5 bilhões para os cofres públicos. Para críticos, essa negociação representa um prejuízo direto ao Estado, que poderia ter investido esse montante em infraestrutura e melhoria dos serviços sem abrir mão do controle da empresa.


Desafios para Áreas Pobres e Rurais


A experiência de privatizações em saneamento no Brasil e no mundo demonstra que empresas privadas costumam priorizar áreas mais lucrativas, como centros urbanos e bairros de maior poder aquisitivo. Regiões periféricas e rurais, onde a infraestrutura é mais cara e o retorno financeiro menor, tendem a acabar marginalizadas.


Esse risco já gera insegurança entre comunidades carentes que dependem da expansão dos serviços. Se os investimentos prometidos não forem realizados de maneira equilibrada, milhões de pessoas podem continuar sem acesso adequado à água e saneamento.


Risco de Redução na Qualidade do Serviço


Com a necessidade de maximizar lucros para acionistas, há o temor de que a empresa corte custos em manutenção e infraestrutura, comprometendo a qualidade dos serviços prestados. Situações semelhantes já ocorreram em outros estados brasileiros após privatizações, como no Rio de Janeiro, onde problemas de abastecimento e qualidade da água se tornaram recorrentes após a entrada da iniciativa privada.


Além disso, casos recentes, como o surto de doenças na nossa Baixada Santista no início de 2024, reforçam a preocupação com a fiscalização da qualidade da água distribuída. Embora a Sabesp tenha negado relação com o problema, especialistas alertam para a necessidade de monitoramento constante por órgãos reguladores.


O Exemplo de Outras Privatizações


A privatização da Sabesp segue uma tendência de desestatização que já foi aplicada a outras empresas públicas no Brasil. No entanto, os resultados dessas experiências são, no mínimo, controversos. No setor energético, por exemplo, a venda de distribuidoras resultou em tarifas mais altas e dificuldades operacionais.


A longo prazo, a privatização da Sabesp precisará demonstrar sua eficácia na melhoria dos serviços e no cumprimento das metas de universalização sem prejudicar a população mais vulnerável. Os desafios são grandes e a esperança é mínima.


Premiação Internacional e Questionamentos


Mesmo nesse cenário, recentemente, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, foi agraciado com o prêmio “Equity Follow-On of the Year” pela revista LatinFinance, em reconhecimento à privatização da Sabesp. A cerimônia ocorreu em Nova York, destacando a operação financeira como um marco significativo. Aos hospitais com convalescentes por conta da contaminação da Sabesp ele não compareceu, mas à cerimônia sim.


É pertinente questionar os reais motivos por trás dessa premiação. Situações semelhantes ocorreram no passado, como no caso do ex-juiz Sergio Moro, que recebeu prêmios internacionais enquanto conduzia a Operação Lava Jato cujas ações visavam atender a interesses estrangeiros, resultando em multas bilionárias pagas por empresas brasileiras ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos, em valores jamais pagos mesmo nos maiores escândalos mundiais como da Siemens e Volkswagen, por exemplo. 


É realmente crucial analisar se a privatização da Sabesp atende aos interesses da população paulista ou se favorece atores internacionais e do mercado financeiro. A celebração de prêmios não deve ofuscar a necessidade de uma avaliação crítica sobre os impactos sociais e econômicos de tais decisões, mas sim o contrário disso.


*José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro, advogado e jornalista. Publicação original: https://josemanoelfg.com.br/sabesp-privatizada-povo-hospitalizado-e-governador-agraciado-em-ny/

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